No início do icônico 1984 de George Orwell está uma cena particularmente memorável. Winston, o herói da história, está confessando em seu diário um encontro sexual com uma prostituta. Embora o Grande Irmão controle rigidamente até a união sexual e apesar do sexo ser visto como "uma operação menor ligeiramente repugnante, como ter um enema". o Grande Irmão ainda não pode retirar da humanidade o desejo e a necessidade por intimidade. Uma noite, Winston se aproxima de uma prostituta perto de uma estação de trem. “Ela tinha um rosto jovem”, escreve ele, “Foi realmente a pintura que me chamou a atenção, pois era branca como uma máscara, e os lábios muito vermelhos, brilhantes. As mulheres do Partido nunca se pintam”. Em uma sociedade onde o medo abjeto e a solidão são a norma, Winston implora pela intimidade do sexo. Mas quando ele vai para o apartamento desta mulher e fica com ela, ele acende uma lâmpada, projetando uma luz brilhante no rosto dela. E logo ele vê que o que tinha aparência de beleza era uma mentira. “O que vira de repente, sob a luz da lâmpada, era que se tratava de uma velha. A pintura do rosto era tão grossa que dava a impressão de que ia rachar como uma máscara de papel cartão. Havia fios brancos no cabelo; mas o detalhe verdadeiramente revoltante era a boca, que se entreabria, revelando nada mais que uma caverna negra. A mulher não tinha dente algum”.
Mas, apesar de seu horror, sua repulsa, Winston continua. Em seu diário ele escreve “Quando a vi sob a luz, percebi que se tratava duma velha, de uns cinquenta anos pelo menos. Mas fui em frente e fiz o que fora fazer”. Embora a mulher tenha perdido todo o apelo sexual, Winston continua em seu ato. Ele continua, porque, embora o seu desejo esteja saciado, ainda o sexo é um ato de rebeldia. Ao dormir com essa prostituta, ele está praticando um ato de profunda revolta contra o Grande Irmão.
Não faz muito tempo que eu escrevi sobre Brian McLaren e fiquei em apuros. Refletindo sobre vê-lo pregando em uma igreja próxima, eu sugeri que ele parece amar Jesus mas odiar a Deus. Com base na reação imediata e furiosa, eu rapidamente retirei essa afirmação. Eu não deveria ter feito isso. Eu acreditava nisso naquela época e acredito agora. E se era verdade então, quanto mais verdade é com o lançamento do seu último tomo A New Kind of Christianity (um novo tipo de cristianismo). Neste livro, finalmente podemos ver para onde a jornada de McLaren o levou: levou-o definitivamente para uma apostasia categórica e sem remorsos. Ele odeia Deus. Ponto final.
“É tempo para uma nova busca”, escreve McLaren, “lançada por novas perguntas, uma busca em todas as denominações em todo o mundo, uma busca por novas formas de crer e por novas formas de viver e servir fielmente no caminho de Jesus, uma busca por um novo tipo de fé cristã”. McLaren molda seu livro em torno “Dez perguntas que estão transformando a fé”. Elas cortam diretamente pelo coração da fé, fundamental em todos os sentidos. Ele pergunta:
A pergunta narrativa: Qual é a linha da história geral da Bíblia?
A pergunta da autoridade: Como a Bíblia deve ser entendida?
A pergunta de Deus: Deus é violento?
A pergunta de Jesus: Quem é Jesus e porque ele é importante?
A pergunta do Evangelho: O que é o evangelho?
A pergunta da igreja: O que vamos fazer com a igreja?
A pergunta do sexo: Podemos encontrar uma maneira de abordar a sexualidade humana sem brigar sobre isso?
A pergunta do futuro: Podemos encontrar uma maneira melhor de ver o futuro?
A pergunta do pluralismo: Como os seguidores de Jesus devem se relacionar com pessoas de outras religiões?
A pergunta o-quê-fazemos-fazer-agora: como podemos traduzir a nossa busca em ação?
Seu propósito, ele insiste, não é responder as perguntas, mas provocar uma reação a elas. Respostas indicam finalidade, reações indicam conversação e abertura. “As reações que ofereço não são como uma jogada no tênis, feita vigorosamente com muito rodopios, em um esforço para ganhar o jogo e assim gerar um perdedor. Pelo contrário, elas são oferecidas como um saque suave; seu objetivo principal é iniciar o jogo, fazer as engrenagens rodarem, chamar a sua resposta. Lembre-se, nosso objetivo não é o debate e a divisão que gera ódio ou um novo estado, mas sim um questionamento que leva a conversa e amizade na nova busca”. Mas isso é mera semântica. Quer respondendo ou criando uma reação (você diz êxtra, eu digo éxtra...), o que McLaren faz através dessas dez perguntas é reescrever completamente a fé cristã. Seu “saques suaves” rasgam o coração da fé.
No centro do seu remix da fé está a afirmação de que a maioria dos cristãos olha para a sua fé através uma falha lente platônica, greco-romana, ao invés de uma lente bíblica, judaica. "O drama de Deus não é uma narrativa moldada pelas seis linhas do sistema greco-romano de perfeição, queda, condenação, salvação e perfeição celestial ou perdição eterna. Tem uma história completamente diferente. É uma história sobre o lado negativo do 'progresso' – uma história da idiotice humana e da fidelidade de Deus, o homem se voltando para a rebelião humana e Deus se voltando para a reconciliação, a intenção humana para o mal e a intenção de Deus para vencer o mal com o bem”. Este Deus greco-romana, que a maioria dos cristãos acredita, é um ídolo "condenável ... defendido por muitos eruditos bem-intencionados mas equivocados e pregadores que respiram fogo do inferno”.
McLaren banca demasiadamente o típico “todo mundo está errado”. Acontece que a maioria de nós (todos, exceto um punhado de intelectuais iluminados, como parece) temos lido a Bíblia através da lente distorcida de uma narrativa greco-romana. Esta narrativa produziu muitos falsos dualismos, um ar de superioridade e uma falsa distinção entre aqueles que estão “dentro” e os que estão “fora”. Essas três marcas da narrativa falsa têm impactado de tal forma a nossa fé que mal podemos ver além delas. Mas Brian está disposto e ansioso para fazer o papel de Moisés, levando-nos para fora do Egito de nossa própria ignorância e para a Terra Prometida do novo cristianismo.
Levaria mais tempo do que eu estou disposto a gastar para oferecer uma explicação ponto por ponto para as respostas que McLaren propõe para cada uma das dez perguntas ou para documentar as ramificações de sua nova teologia. Ele nega a queda, ele nega o pecado original, nega a depravação humana, nega o inferno. E isso só nas primeiras poucas páginas. Nem é necessário dizer que tudo isto leva a uma visão radicalmente anti-bíblica da cruz e do propósito da obra de Jesus. Embora ele insista que ele considera a Bíblia “inspirada” (embora certamente não em um sentido tradicional do termo), ele também diz que a maioria dos cristãos estão lendo a Bíblia de forma errada, vendo-a como uma espécie de constituição que Deus nos dá pela inspiração do Espírito, uma inerrante revelação de si mesmo. “Estou recomendando lermos a Bíblia como uma biblioteca inspirada. Esta biblioteca inspirada, preserva, apresenta e inspira uma continua conversa vigorosa com e sobre Deus, um argumento civil vivo e vital no qual todos somos convidados, através do qual Deus se revela”. Afinal de contas, “revelação não somente acontece nas declarações . Ela acontece em conversas e argumentos que ocorrem dentro e entre comunidades de pessoas que compartilham as mesmas questões essenciais através das gerações. Revelação se acumula nas relações, interações e relações existentes entre as declarações”.
Para que serve a Bíblia então? O que ela nos ensinam sobre Deus? “As Escrituras revelam fielmente a evolução das melhores tentativas dos nossos antepassados para comunicar suas sucessivas melhoras na compreensão de Deus. Conforme cresce a capacidade humana de conceber uma visão maior e mais sábia de Deus, cada nova visão é fielmente preservada nas Escrituras como fósseis em camadas de sedimentos”. A Bíblia é uma conversa sobre o caráter de Deus em que os seres humanos chegam a entendimentos progressivamente mais precisos sobre quem Ele é. Não há nenhuma razão para pensar que qualquer deles realmente esteja certo. Sua reinterpretação de Jó e Romanos é um espetáculo para ser visto, tão confusa e tão manipuladamente fabricada que se torna absolutamente sem sentido. Há uma ignorância deliberada em andamento aqui.
A arrogância de tudo isso é impressionante. McLaren está mais irritado do que antes e mais escarnecedor. Ainda assim, ele apresenta suas ideias revestidas com o verniz de uma falsa humildade. Mas, facilmente, ele constrói pelo livro os mecanismos que ele irá utilizar para responder a seus críticos. Ele vai simplesmente acusar seus detratores de ter essa velha compreensão greco-romana da fé. Nós pobres fundamentalistas não podemos estar entre o novo tipo de cristão, até que sejamos iluminados para entender a Bíblia através de uma estrutura narrativa inteiramented nova. Só então é que tudo isso ficará claro. Até então, os mais dignos de pena somos nós entre todos os homens.
Aqui em A New Kind of Christianity é como se McLaren estivesse gritando “eu odeio Deus” a plenos pulmões. E enxames de cristãos estão olhando para ele com admiração e dizendo: “Viu como esse cara ama a Deus"? Eu não sei o que McLaren poderia fazer para tornar a situação mais clara. Na verdade, seu livro é quase indistinguível de muitas das narrativas de des-conversão que estão brotando hoje por aí. Compare-o com o livro God’s Problem (Problema de Deus) de Bart Ehrman e você verá muitos dos mesmos argumentos e das mesmas dúvidas; você vai perceber, porém, que Ehrman é pelo menos mais honesto. Ele pelo menos tem a integridade de abandonar completamente a fé em vez de reinventar a Deus à sua própria imagem.
McLaren diz que preferiria o ateísmo ao invés da crença no Deus que muitos de nós vemos nas Escrituras. Bem, ele não está muito longe disso. Esta nova espécie de Extreme Makeover: Edição Deus, onde o cristianismo não é cristianismo de verdade. Não é uma fé feita à imagem de Jesus Cristo, mas uma fé feita à imagem de um homem que despreza Deus e que se inclina para as trevas arrastando outros com ele enquanto ele se torna seu próprio deus.
Como quando Winston ligou a luz, ele viu a prostituta por aquilo que ela realmente era. Aqui McLaren aparece a luz e vemos como realmente é a sua fé, como realmente é o seu cristianismo. Vemos isso em sua forma desdentada, com maquiagem de horror. Este novo tipo de cristianismo é simplesmente o paganismo por trás de uma espessa camada de falsa humildade e de linguagem bíblica. É uma expressão de rebeldia contra Deus, muito mais do que um exercício de nova intimidade com o Criador.
E como a prostituta de Orwell, muitos vão para este livro buscando intimidade com Deus só para se contentarem com a rebelião contra Ele. Pois cada um se satisfaz a sua própria maneira.
Por Tim Challeys: A New Kind of Christianity
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